O tédio é uma forma de luto (e ninguém fala disso)
Sim, você tá ‘bem’. Mas por que parece que morreu por dentro?
Tem dias em que eu me sinto como um arquivo corrompido: tudo parece intacto por fora, mas por dentro nada abre direito. As coisas funcionam, eu respondo mensagens, lavo o cabelo, escolho a roupa certa, até posto alguma coisa irônica no story — mas por dentro, tudo está... desligado. Uma versão zumbi de mim mesma que cumpre os protocolos da vida enquanto tenta lembrar o que, exatamente, costumava me deixar animada.
Não é tristeza. Não é depressão clínica. É mais um silêncio desconfortável. Um desinteresse. Uma falta de vontade que não explode em choro, só em suspiros longos e olhares fixos pro teto. Um tédio que não vem do “não ter o que fazer”, mas do “não ver sentido em fazer”.
E aí percebo: isso é luto. Um luto estranho, sutil, que ninguém reconhece porque não tem corpo, nem velório, nem comunicado oficial. Mas é luto. Estou de luto pelas versões de mim que morreram sem aviso. Pela fase da vida que ficou pra trás. Pela paixão que esfriou. Pelo sonho que já não me empolga. Pela rotina que se tornou ruído.
O tédio, às vezes, é só a forma do corpo viver o que a mente ainda não teve coragem de nomear.
Tem uma cena de Lost in Translation que sempre volta nesses momentos: a Charlotte (Scarlett Johansson), sentada na janela do quarto de hotel em Tóquio, olhando a cidade sem saber o que está sentindo. Nada acontece. Mas tudo dói. É aquele tipo de silêncio que só quem está em luto por dentro entende. A vida está ali — colorida, vibrante, iluminada — e mesmo assim ela não consegue se conectar. Porque às vezes a gente não está triste. Só... distante.
Já reparou como a gente aprendeu a temer o tédio? Desde criança, “não ter o que fazer” era quase uma ameaça: vai ler um livro, vai brincar, vai produzir. Crescemos acreditando que o tempo parado é tempo desperdiçado — quando, na verdade, às vezes ele é só um tempo de luto. De processamento. De espera. De transição.
O problema é que esse luto silencioso acontece enquanto o mundo segue correndo. Todo mundo parece ótimo. Gente empolgada com projetos, com relacionamentos, com yoga às seis da manhã. E você ali: tentando lembrar se já tomou água hoje ou se só passou mais um dia inteiro no modo avião afetivo.
E é nessa hora que vem a vergonha. Como se você estivesse devendo uma energia que não tem. Como se não estar animada fosse sinal de fracasso. Mas não é. É só luto. Luto por uma fase da vida que não volta. Por uma alegria que não chegou. Por uma versão de si mesma que, por algum motivo, você perdeu no caminho.
Talvez o maior desafio não seja sair do tédio — mas permitir que ele exista sem culpa. Sem precisar performar energia pra parecer bem. Sem inventar uma crise só pra sentir algo. Sem anestesiar com séries, rolês forçados, conversas que não dizem nada.
Porque às vezes o que você está sentindo não é apatia. É dor não reconhecida. É ausência sem nome. É cansaço acumulado de fingir que está tudo certo.
E isso não se resolve com produtividade. Nem com frases motivacionais. Se resolve com escuta. Com presença. Com carinho. Com um chá quente e o reconhecimento honesto de que, sim, você está de luto. Não por alguém. Mas por você mesma.
SIM!
Recentemente, percebi que eu estava tirando aos poucos, tudo o que eu amava. Livros, escritas, desenhos, pintar as unhas, etc, como forma de me punir, caso eu não tenha feito algo que era uma “meta”. E eu fui morrendo por dentro, como você mencionou. Eu decidi colocar um basta nisso, já que essa minha atitude estava me deixando depressiva. E eu melhorei (tive suporte psiquiátrico e psicológico), mas voltar as minhas raizes, e reviver meus antigos “eus” me trouxeram a vida, de certa forma
me fazendo chorar às 7:00 da manhã autora